Para Cesar Maia, falta homogeneidade ao Centrão para virar base

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(Valor Econômico, 24) RIO – Num momento em que seu filho e presidente da Câmara dos Deputados é alvo dos mais pesados ataques do bolsonarismo, o vereador do Rio Cesar Maia (DEM) afirma que a tentativa de Jair Bolsonaro de isolar a influência do parlamentar nesta ou na próxima legislatura não é necessariamente factível.

Cesar Maia sugere que, sem uma boa interlocução com a presidência da Câmara, a articulação política de Bolsonaro diretamente com as legendas do Centrão não lhe facilitará a governabilidade. O varejo das conversas, sem a delegação de poder a um líder que vertebre as diferentes siglas ligadas ao bloco, pode ser infrutífero.

“Não sei bem o que é Centrão. As reuniões recentes do presidente [Bolsonaro] com partidos mostra isso. Claramente não há homogeneidade garantida. Cada voto no Parlamento dependerá do fato que se vota”, diz.

Para Cesar Maia, o movimento de Bolsonaro em busca de uma aliança com partidos do Centrão é mais fruto de uma surpresa do governo federal com a grande crise da pandemia da covid-19 do que uma guinada nas relações entre Executivo e Legislativo.

“O que mudou foi a crise do coronavírus, que surpreendeu o governo. Excluindo os carimbos partidários, nada mudou politicamente. Os grupos intragoverno desde a eleição, mesmo não tendo a chancela partidária, são grupos políticos”, afirma.

Para Maia, muito do que virá depende da resposta do governo federal à crise do coronavírus. Inclusive a reação da base de simpatizantes radicais do presidente. Bolsonaro é apoiado por eleitores movidos sobretudo pela antipolítica. Nas redes sociais, já demonstram incredulidade ou recorrem a malabarismos retóricos para negar um estelionato eleitoral.

O presidente se aproxima de figuras tradicionais da velha política como Roberto Jefferson, Valdemar Costa Neto e Ciro Nogueira, dirigentes, respectivamente, de PTB, PL e PP, trinca um dia chamada de “os três porquinhos” do fisiologismo nacional.

Para o ex-prefeito do Rio, não há como prever se a aliança levará à queda de popularidade de Bolsonaro. “A taxa de sucesso ou insucesso na área de saúde deve balizar as tendências”, afirma.

A procura pelo Centrão ocorre depois de seguidas tentativas de Bolsonaro de dobrar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), contra os quais jogou sua militância. O enfrentamento culminou com a presença e discurso do presidente em ato com cartazes que pediam a intervenção militar, em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília, no domingo. Para Cesar Maia, a possibilidade de Bolsonaro promover um autogolpe é zero. “De nenhuma forma. As instituições pós-1988 são muito sólidas”, diz o ex-prefeito.

Em sua opinião, o prejuízo ao país provocado pelo grupo antidemocrata que pediu a edição de um novo Ato Institucional nº 5 (AI-5) – norma que suspendeu direitos individuais e endureceu a ditadura militar em 1968 – deve ser ponderado.

“O STF se antecipou a estes problemas. A partir disso há sinais positivos”, aponta. Nesta semana, o Supremo aceitou o pedido feito pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, para se investigar quem organizou e financiou os atos pelo país.

Para o vereador, a participação de Bolsonaro na manifestação não configura crime de responsabilidade. O pai de Rodrigo Maia, responsável por acolher pedidos de impeachment contra o presidente da República, também não vê condições políticas para que um processo de afastamento prospere.

Cesar Maia, que costuma dizer que o filho tem um perfil muito diferente ao seu, com mais paciência para a costura política, segue a mesma linha de cautela e diz ser “um fã e liderado do Rodrigo”. Nega se sentir atingido pelos ataques de Bolsonaro, como na insinuação, feita na semana passada, de que o presidente da Câmara busca o diálogo como forma de realizar algum tipo de negociação escusa. “Faz parte da política”, minimiza.

Cesar Maia afirma que o filho não deve ter o mandato como presidente da Casa renovado, no ano que vem. Para isso, é aventada a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição que permita a reeleição dele e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre: “Não creio que seja tomada essa iniciativa”.

Maia também não é favorável a mudanças na Constituição que alterem o sistema de governo. O assunto voltou ao cenário diante do impasse entre Bolsonaro e o Congresso. Entre os modelos à disposição na prateleira estão o parlamentarismo e o semipresidencialismo. “Fui deputado constituinte e entendo que este arcabouço constitucional e as cláusulas pétreas devem continuar pétreas”, defende.

Para Maia, os efeitos da pandemia – que bateu recorde de mortes no país, com 407 óbitos em um dia, pelos dados divulgados ontem – serão determinantes para a política e a economia. Sobre a atuação de Bolsonaro, que minimizou a doença desde o início, resume: “A resposta foi dada por ele mesmo, que afirma que assumiu os riscos”.

Em sua opinião, as propostas em andamento no Congresso, como respostas à crise, são consensuais e “único caminho” possível. Pai de um liberal, como Rodrigo Maia se define, Cesar afirma que a pandemia, no entanto, cria uma inflexão “inevitavelmente mais estatizante” na condução da economia.

Nas eleições municipais, prevê, o “envolvimento de todos na luta contra o covid-19 será um tema novo”. A atuação diante da pandemia tende a aumentar a popularidade de políticos em sintonia com a população, analisa. É o caso do governador Wilson Witzel (PSC), em cuja gestão o DEM ocupa a secretaria de Obras – “ele cresceu muito no combate à covid-19” – e até do prefeito e adversário Marcelo Crivella (Republicanos). A percepção de Maia é que a avaliação do prefeito “melhorou bastante nas últimas duas semanas”. Entre as razões estariam medidas como a obrigatoriedade do uso de máscaras e a compra de equipamentos. A permanente exposição na mídia também pode favorecer. “Em nível internacional isso tem ocorrido [com os mandatários]. Aqui há que aguardar”, diz o vereador, que, no entanto, é cético em relação ao fortalecimento de Crivella.

O partido do prefeito filiou os filhos e a ex-mulher do presidente, Rogéria. Carlos deve liderar a máquina bolsonarista nas redes sociais a favor de Crivella, como fez para eleger o pai.