Fonte Folha de São Paulo
A disputa de cargos, em todos os níveis, e de benesses governamentais, entre os partidos que apoiam o governo federal, remete ao sistema de cortes das monarquias nos séculos 16 e 17. As cortes palacianas viviam no entorno dos reis, disputando cargos, concessões e favores.
Os homens fortes das cortes eram aqueles que, por proximidade com reis e rainhas, conseguiam para seus apaniguados decisões que lhes davam poder e riqueza. As cortes dos vice-reis na América hispânica aprofundaram o sistema. As “encomiendas”, por exemplo, eram concessões de caráter feudal com cessão de terras e seus índios, para o uso econômico e deleite dos “encomenderos”. Outro exemplo era o “corregimiento”, uma região onde o “corregidor” tinha todos os poderes e onde esse poder até se comprava.
Os vice-reis da Espanha no Peru e no México (Nova Espanha), nos séculos 16 e 17, com status de “alter ego” do rei, punham e dispunham sobre tais concessões. Em torno deles, construíram-se amplas cortes que se dividiam em funções administrativas e de proximidade com o vice-rei.
Era tão bom, que fazer parte do séquito de um vice-rei nomeado na Espanha tinha preço. A orientação básica da coroa era prestigiar os chamados “beneméritos”, ou seja, os que chegaram na frente para conquistar e colonizar.
Mas o que ocorria eram nomeações e concessões ao grupo íntimo do vice-rei ou aos indicados por ele. Os abusos chegaram a tal ponto que, em 1619, o rei Felipe 3º regulamentou a ocupação de cargos, proibindo empregar e fazer concessões a parentes até o quarto grau.
Em 1660, Felipe 4º repetiu a mesma resolução, pois as cortes no Peru e na Nova Espanha não haviam dado a menor bola para a determinação.
A solução no século 18 foi tirar poder dos vice-reis e transformá-los em burocratas do Estado espanhol.
O que vemos por aqui é uma adaptação disso. Um partido tem direito de nomear em órgãos que passam a ser suas “encomiendas”. O quoteo de ministérios, órgãos e empresas estatais são como “corregimientos”. O líder de bancada de prestigio é aquele que, por proximidade com o poder ou por intimidação, abre amplos espaços para os seus protegidos. Mesmo que indiretamente, isso tudo tem um preço.
Não tão abertamente como as vagas no séquito dos vice-reis, mas de forma mais intensa e rentável. Como nas cortes, vai se criando um hábito.
E só se lembra do método quando os desvios são publicados. Os servidores profissionais independentes vão ficando de lado, como ocorreu aos “beneméritos”. E -da mesma forma que os Felipes 3º e 4º- não será por falta de leis, decretos e resoluções. Enquanto isso o Estado vai ficando caro, improdutivo, ineficiente, e algumas vezes, corrupto.