Publicado em 14.02.2009 em Folha de São Paulo
AS INSTITUIÇÕES políticas nacionais vêm sendo desintegradas. O processo de construção institucional, aberto na Constituinte de 1988 e testado pela crise presidencial de 1992, começou a ruir quando reformas econômicas supostamente modernizantes avançaram sobre a ordem do dia, serviram para justificar o superativismo presidencial e deram aval até ao aluguel de votos, de forma a garantir o que se dizia imprescindível.
A partir daí, competências federativas do Senado foram sendo invadidas pelo Ministério da Fazenda. A Federação acabou fragilizada pela centralização fiscal e financeira, além de restrições legais que só se tornaram aplicáveis aos Estados e municípios. Se antes era assim numa Presidência intelectualmente orgânica, quando assumiu o poder quem nunca ocultou o desprezo pelo Poder Legislativo, esse processo ganhou intensidade e, em seis anos, desmontou o que existia de instituições políticas no país.
Caiu até o partido do presidente da República, que se jactava de sua integridade política. Em 2005, o aluguel passou a ser de mandatos e ganhou coordenação, assumida pela própria direção do partido presidencial. Flagrado, o sistema foi substituído por outro mais eficaz: favores generalizados no varejo e um autoritarismo pragmático, com o Executivo assumindo abertamente as funções do Legislativo e tornando-o desnecessário.
Numa situação dessas, tanto faz ter ou não partido na base parlamentar. É até melhor não ter. A votação da Lei do Orçamento -coluna vertebral do Legislativo- passou a ser uma espécie de “videogame” para parlamentares, além de ocupação do noticiário. Tanto faz aprová-la ou não, uma vez que é possível a criação de despesa por medida provisória.
O governo deu nome próprio a seu próprio Orçamento e lança-o à opinião pública, e à imprensa, quando bem entende. Por meio de decreto ou de medida provisória, o Executivo legisla sobre qualquer coisa, ignorando a Constituição. Às vezes, o Supremo Tribunal Federal, STF, põe a Constituição de pé e, em alguns casos, até exagera, legislando também.
Há uma década as contas dos presidentes e os vetos presidenciais não são votados. Ou seja, inexiste a função fiscalizadora do Legislativo, e as leis -com vetos- não se completam. Sem sua vértebra institucional básica, a democracia está amputada. E o “Estado” funciona com dois Poderes e um terceiro, de expectadores usurpados, mas que se dizem felizes.
Na busca de uma expressão, os anos 1650, na Inglaterra, ajudaram com sua crise política institucional e um Parlamento desossado: “Barebones”. Vale dizer: instituição esvaziada, que se demitiu de suas responsabilidades intransferíveis.