HÁ RELAÇÃO ENTRE AS MANIFESTAÇÕES E AS ELEIÇÕES?

(Clovis Rossi – Folha de SP, 01) 1. Quem viu a imponente massa que ocupou as ruas das grandes cidades da Turquia em maio do ano passado só poderia acreditar que o governo, conduzido pelo primeiro-ministro Recep Tayyp Erdogan, seria surrado em grande estilo na primeira oportunidade em que a Turquia votasse. Afinal, os protestos começaram para defender um parque central que seria devastado por uma reforma de discutível gosto urbanístico, mas logo se tornaram uma campanha pela renúncia de Erdogan. Ainda por cima, depois vieram denúncias de corrupção envolvendo, entre outros, o filho do premiê, e, mais recentemente, uma tentativa de bloquear o Twitter e o YouTube, o que só poderia escandalizar os manifestantes de maio passado, que se mobilizavam exatamente pelas redes sociais, agora perseguidas.

2. Nada disso foi suficiente para que o eleitorado desse as costas para Erdogan, há 11 anos no poder, durante os quais conquistou por três vezes a maioria absoluta dos votos. O premiê fez questão de transformar as eleições locais de domingo em um plebiscito a respeito de sua gestão. Ganhou, e com uma porcentagem de votos (44%) superior aos 39% que obtivera nas municipais anteriores, em 2009.  Seu partido, o islamita moderado Justiça e Desenvolvimento (AKP da sigla turca), levou ainda as prefeituras das duas principais cidades, Istambul e Ancara.

3. No caso da Turquia, parece claro que há um divórcio entre os setores urbanos modernos e conectados e as massas conservadoras e tradicionais apoiadoras do AKP. E no caso do Brasil? Minha impressão: não surgiram lideranças capazes de empolgar a turma que inundou as ruas em junho passado.

4. Conclamação de Elena Valenciano, cabeça de chapa do PSOE da Espanha para as eleições europeias de maio: “Não basta indignar-se, é preciso votar e ganhar”.  Contexto: Valenciano está, na prática, fazendo um apelo à massa de “indignados” que tomaram as ruas da Espanha no ano passado, movimento de resto imitado em incontáveis outros países (Brasil inclusive), mas com nulos resultados do ponto de vista eleitoral.