Matéria do Valor Econômico.
Pai vê filho como líder do ‘médio clero’
Pai de Rodrigo Maia (DEM-RJ), eleito presidente da Câmara, o ex-prefeito do Rio por três mandatos Cesar Maia (DEM) afirma que a gestão do filho representará uma inflexão no estilo da Casa, sem levar à frente pautas conservadoras, como defendia o ex-presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ). “O presidente de um Legislativo democrático não prioriza suas opiniões”, diz Cesar Maia, em entrevista ao Valor. Noutra distinção em relação a Cunha, que ascendeu na Câmara como líder do Centrão, formado por partidos e deputados sem grande expressão, o ex-prefeito do Rio afirma que Rodrigo Maia não se dirigiu ao baixo clero, quando – em discurso antes da votação do segundo turno, na madrugada de ontem – pregou o fim do “império dos líderes”. “Claramente ele fala ao médio clero, com expectativa e capacidade de ascensão”, pontua o hoje vereador. Para Cesar Maia, a tese de um “plenário aberto”, com as articulações “sem restrições ideológicas”, foi fundamental para a vitória do filho.
Em sua visão, o papel de Rodrigo Maia será de cooperação com o governo Michel Temer, dada a seriedade da crise econômica e ressalvadas as preferências da Casa. “A ele cabe a gestão da Câmara dos Deputados e abrir democraticamente o debate, garantindo as forças políticas e em especial o Poder Executivo, num momento grave como esse, que amplia as responsabilidades do Executivo”, diz. O ex-prefeito diz que quanto à superação da crise fiscal “a iniciativa é do Executivo, nesse momento, pelos prazos”. Economista de formação, Cesar Maia afirma que “há que se avaliar o que o Executivo proporá”, mas considera que, por enquanto, o que Temer defende lhe “parece adequado”, como a proposta de emenda constitucional que prevê um teto de gastos para o governo federal, corrigido apenas pela inflação. “O teto é uma necessidade de transição como um freio de arrumação”, diz.
Sobre a flexibilização das dívidas dos Estados e o reajuste do funcionalismo público, Maia considera que são necessários, apesar de irem na contramão do ajuste fiscal. “Num Parlamento pulverizado, a gestão política exige talento, paciência e experiência. Até que as forças políticas se cristalizem com suas teses, as concessões feitas eram inevitáveis para compor maioria e [buscar a] pacificação política e social”, diz.
Cesar Maia afirma que não deu qualquer conselho ou recomendação ao filho, durante o processo de candidatura à presidência da Câmara. “Zero. Nenhuma. Até porque meu estilo diferente do dele poderia atrapalhar. Nossas identidades políticas são distintas. Não é ideológico: é estilo. Rodrigo desenvolveu a capacidade de articular, de ouvir, tem paciência de fazer política. Eu sou mais ansioso e mais administrativo”, distingue o ex-prefeito, cujo traço sempre foi mais o gosto pela gestão do que pelas costuras políticas. “Identidades diferentes podem ser eficientes cada uma em seu campo. Como jogadores de futebol”, compara Maia.
Na articulação para chegar à presidência da Câmara, Rodrigo Maia se aproximou do PT, histórico adversário dele, do pai e do partido de ambos, o DEM. Em agosto de 2005, o então senador por Santa Catarina e presidente da legenda, Jorge Bornhausen, disse que estava “encantado” com a crise do mensalão “porque a gente vai se ver livre dessa raça [PT], por, pelo menos, 30 anos”. Em 2010, no auge da popularidade, o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva pregou “extirpar” o DEM da política brasileira, quando fazia campanha para eleger Dilma Rousseff, num comício em Joinville, reduto de Bornhausen.
Cesar Maia diz não se sentir vingado pela vitória do filho, que põe o partido novamente numa posição de destaque no cenário nacional. Será o segundo na linha sucessória. “Nada tem a ver. Isso faz parte de um passado que ele se propõe a superar. Lula recebeu os sinais dele por interlocutores. O segundo turno mostrou isso”, afirma o ex-prefeito, sugerindo que Rodrigo recebeu votos de muitos petistas. “A política da vingança, a política do ‘não perdoa um fato’, tem que ser superada. Se não fosse assim como ele [Rodrigo] se aproximaria como o fez de políticos com quem eu tive tantos e fortes atritos?”, diz.
Questionado se a eleição do filho antecipa a vitória de um tucano na próxima disputa pela presidência da Câmara, em fevereiro, ou a cassação de Cunha pelo plenário, Cesar Maia preferiu apontar para outra direção: “[Antecipa] uma reforma política progressiva por consenso e não unanimidade”, prevê.