1. O secretário Beltrame, ao assumir em janeiro de 2007 e dentro de sua capacitação como polícia de inteligência, destacou que iria identificar os depósitos de armas e drogas nas comunidades e desintegrá-los. Depois, com o ataque e assassinatos de PMs, alterou sua estratégia e iniciou ações repressivas contra o tráfico em várias comunidades.
2. Num terceiro momento, desdobrou as ações que, por anos, foram realizadas contra o tráfico em favelas, como postos policiais e permanência no perímetro delas, e lançou o programa das UPPs, unidades de polícias pacificadoras. Agora, em comunidades selecionadas, a presença da polícia seria permanente.
3. As ocupações pela PM eram pré-anunciadas, dando tempo aos bandidos para mudar de endereço. Começando pela Zona Sul do Rio e em seguida pela Tijuca, em bairros de classe média, as UPPs foram saudadas como uma grande vitória na segurança pública. A imprensa do Rio e de S. Paulo abriu seus editoriais para comemorar e apoiar. A presença do secretário Beltrame, para jantar em restaurantes, era recebida com aplausos por todos de pé.
4. Para garantir a permanência das PMs nas UPPs era necessário multiplicar o efetivo por morador. O normal, num batalhão da PM, são 1000 PMs para 400 mil habitantes, ou 1 PM para 400 habitantes. Mas, nas UPPs, essa relação, à partir das primeiras favelas ocupadas, era de 1 PM para 30 habitantes, ou menos.
5. Com essa proporção, impôs-se a necessidade de reduzir o número de PMs dos batalhões, indo para as UPPs e aumentar o efetivo através de concursos. E retirar os PMs do trânsito, entrando terceirizados pela prefeitura.
6. O esvaziamento do policiamento ostensivo foi flagrante. Quase não se via mais PMs circulando no clássico policiamento ostensivo. De forma a que a percepção pelas pessoas da ausência de policiais não gerasse insegurança, multiplicou-se o número de viaturas que, circulando, criavam a sensação de presença da polícia. Mas isso não é policiamento ostensivo.
7. A curva decrescente de homicídios no Rio e em S. Paulo -que já vinha de vários anos, inclusive em função do deslocamento do corredor de exportação de drogas para o Nordeste em direção à África Ocidental- foi associada à uma nova política de segurança via UPPs. Ilusão.
8. Na medida em que a saída dos traficantes de várias comunidades não foi acompanhada pela saída do tráfico de drogas, era evidente que o retorno do efetivo de traficantes anterior era “missa anunciada”.
9. E tanto ou mais grave ainda foi o fato que com traficantes deslocados e comunidades ocupadas, o crime de rua não diminuiu como os homicídios, muito pelo contrário. E na medida em que o tempo passava, os crimes de rua cresceram exponencialmente.
10. E a delinquência passou a ser ostensiva e cada vez mais violenta, com imagens que as TVs flagravam sem dificuldade e que as pessoas passaram a ver -e sofrer- no seu cotidiano. Crimes de rua de todos os tipos: assaltos, roubos de veículos, roubos de celulares, roubos de carga, banalização das mortes em assaltos, etc. E estupros, assaltos a residências, a veículos…
11. A presença violenta e ostensiva de gangues do tráfico nas ruas passou a compor a cenografia urbana. Registre-se que a crise fiscal do Estado, com atrasos de pagamentos etc., veio após a reversão do quadro de criminalidade no Rio.
12. Se pelo menos a memória estivesse presente no gabinete do secretário de segurança, haveria uma referência ao final de 1994 e início de 1995, quando a intervenção do exército no Rio, ocupando favelas, foi também saudada como um novo momento. Mas o crime veio para as ruas e os delitos foram multiplicados. A resposta encontrada pelo governo estadual da época foi exponenciar a repressão.