“A CONSTITUIÇÃO SE TORNOU UMA LÍNGUA GERAL DA POLÍTICA BRASILEIRA”! “O MINISTÉRIO APRESENTADO POR TEMER É POLITICAMENTE MUITO DENSO E TREINADO”!
(Luiz Werneck Vianna, Doutor em Sociologia – PUC-RJ. Entrevista ao Estado de S.Paulo, 14) 1. O voto continua valendo o que vale. Está todo mundo interessado no voto em 2018. O País logo vai se mobilizar para as eleições municipais. A democracia brasileira se consolidou, vem se consolidando, as instituições vêm demonstrando capacidade de resistência, ou seja, a arquitetura constitucional de 1988 está passando por testes muito duros e está indo muito bem. A democracia política foi reforçada pelo discurso de todos, dos perdedores e vencedores. A Constituição se tornou uma língua geral da política brasileira. A questão que tem que ser verificada é como esse governo vai se encontrar com a opinião pública com tão pouco tempo para sanear as contas públicas. Esse ministério apresentado pelo governo Temer é um ministério politicamente muito denso e treinado.
2. Uma coisa assustadora e terrificante é imaginar que tipo de governo esse tipo de esquerda (MST-CUT) poderia compor um governo neste País. As críticas vêm de pessoas que não se dão conta da natureza das coisas, dos processos novos que estão em curso no País e do mundo, que já não é mais o da Margareth Thatcher (primeira-ministra britânica de 1979 a 1990), mas o do Barack Obama (presidente dos EUA), do papa, da Angela Merkel (premiê alemã), da ONU. Essa esquerda (MST-CUT), ainda está no mundo de Ronald Reagan (presidente dos EUA de 1981 a 1989). O anacronismo é uma marca da cultura política brasileira, mas ela persiste porque a política foi usurpada da sociedade. O PT, que nasceu com vocação de simular a vida civil, associativa, da deliberação, do assembleísmo, tornou-se um partido de Estado, aparelhou e deseducou a sociedade.
3. (A resistência dos movimentos sociais é um problema?) Não, o governo nasce com desafios muito fortes. A temperatura pode ser elevada, mas não vai passar de nada que seja muito impactante. É só tomar como referência esse processo das ruas desde que o movimento do impeachment surgiu. Não houve nenhum atropelo, os conflitos foram mínimos, as ocorrências policiais praticamente foram inexistentes.
4. O momento é de enorme dificuldade para todos. Não se governa este País sem o PMDB, o Lula aprendeu isso. O partido tem capilaridade, é uma força da tradição. Como se governa esse País sem o centro político? Pela esquerda? A Dilma tentou. Tem que entender porque a Dilma perdeu capacidade de sustentação. Não foi um movimento político e social que fez emergir o governo Temer. Ele está emergindo porque caiu a política do governo, a economia e também no plano ético-moral. A saída institucional é o Temer assumir. Ele vai ter que se legitimar pelas políticas, demonstrando capacidade de pôr a economia nos eixos, de animar a sociedade com novos horizontes. É um cenário muito difícil. Qual seria a alternativa? Novas eleições? Você convocar eleições a partir dessa ruína, sem que a sociedade tenha tempo de se organizar, para criar espaço para um herói providencial, um cavaleiro da fortuna de sabe-se lá onde? De onde vem o cavaleiro da fortuna, sem apoio, com linguagem demagógica? A Dilma não está sendo derrubada.
5. Este País está sem governo. Há quanto tempo a Dilma não governa? Inclusive ela não gosta e não sabe governar. As lideranças mais conscientes têm consciência disso, de que as coisas chegaram a esse ponto por incompetência política e administrativa dela, pelos erros dela. Derruiu. O que fica no lugar? Fica no lugar um vice e as instituições. A política brasileira tem que ser pensada agora de forma absolutamente responsável, sob pena de entrar numa conjunção que vai fazer com que todas as nossas conquistas sejam perdidas. Retrocesso é perder o que conquistamos do ponto de vista político institucional.
6. Os partidos estão em ruínas. O PSDB só tem califa querendo o lugar do califa, é uma luta pelo poder desvairada. Não tem quadros, só nos vértices, mas estão todos envolvidos em projetos pessoais de grandeza. Tem o Fernando Henrique Cardozo, que já não tem ambição do califado e ainda mantém os pretendentes no equilíbrio. Mas o PSDB não é um partido político moderno porque não tem cabeça, troncos e nem membros. A questão é como sair de uma barafunda dessa para um situação avançada, de enraizamento do governo na sociedade, criando uma agenda que possa ser produzida de uma forma que a sociedade entenda, legitime e aceite. Não é essa a situação atual.
7. A Dilma volta para governar com quem? Com que Parlamento? Lula é uma referência poderosa dentro do PT. Dizer que ele não está machucado seria uma ingenuidade. Deve estar sofrido. É um nome forte da política brasileira que não vai sair dela assim facilmente. É uma referência mais do que histórica, tem comando, liderança, talento político, mas malbaratado pela presidente que elegeu.
8. (semiparlamentarismo teria respaldo social?) Sim porque o presidencialismo brasileiro saiu malquerido nesse segundo impeachment. Foram dois em 25 anos, é muita coisa. E afora a história das crises políticas que têm sido a tradição do nosso presidencialismo, com Jânio Quadros, João Goulart e Getúlio Vargas. A sociedade brasileira está amadurecendo para o semipresidencialismo ou para formas de parlamentarismo mais presentes na vida das pessoas porque a sociedade está se organizando. Não tem como entender o período de 2013 para cá sem registrar que há um processo de auto-organização social na vida brasileira. Só que ela ainda não se encontrou com os partidos, com a política, mas vem se encontrando.
9. A sociedade está se educando, passando por um processo em que sua auto-organização é cada vez mais desejada por ela própria. Ela não está mais identificando a representação legislativa como resultado de sua vontade. É claro que um governo com as características do Temer, que não saiu das urnas, vai ter uma dificuldade quase intransponível para realizar a agenda de mudanças necessárias. O que ele pode fazer agora é limpar o terreno para aquele que virá em 2018 levar adiante a tarefa de aprofundamento da democracia política no Brasil. Ele o fará com homens disponíveis para essa tarefa, que não saíram da soberania popular, mas de um processo de ruínas. O capital político do Temer para agir agora é pequeno.
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EDUARDO GIANNETTI ECONOMISTA DE MARINA SILVA: TRECHOS DA ENTREVISTA À FOLHA DE S. PAULO (14)!
1. Não é exagero dizer que economia brasileira está na UTI. O primeiro desafio será estancar a hemorragia, a total descrença dos agentes. O governo Temer pode levar a economia para a convalescença, mas não a uma recuperação plena até o final deste mandato tampão.
2. Três coisas vão ajudar: a inflação dá sinais de arrefecimento, o que abre espaço para redução dos juros; as contas externas estão ajustadas; e, por conta da recessão, há capacidade ociosa de máquinas e de mão de obra qualificada disponíveis para rápida mobilização. O que faz diferença e precisa retornar é a confiança do consumidor e do investidor.
3. Temer pode ser para Dilma o que Itamar foi para Collor, ou seja, alguém que prepara o terreno para que o mandato seguinte possa avançar.