Publicado em 14/11/2009 em Folha de São Paulo
O CULTO À PERSONALIDADE chegou ao Brasil com pompas e circunstâncias. A elevada autoestima de Lula, exibindo-se todos os dias, por qualquer razão, terá o seu momento de apoteose com a exibição do filme “Lula, o Filho do Brasil”.
A distribuição para 800 salas de exibição, sindicatos e associações será suplementada e multiplicada pelos ambulantes. A sensação que passa é que há interesse para que seja assim. Os desdobramentos políticos se darão em duas direções: a “enanização” do papel de sua candidata e a campanha presidencial de 2010. Não é tão simples supor que sua acomodação no marsúpio lulista a levará à Presidência. A mercadologia eleitoral mostra que a transferência de votos se dá com mais facilidade quando o perfil do receptor se aproxima do perfil do emissor. A exaustiva insistência na origem retirante de Lula não o identifica com sua candidata. Isso pode causar desconfiança.
Mas a questão central é a agenda eleitoral. Se há algum consenso entre os especialistas é que a disputa entre os candidatos para impor sua agenda é um fator decisivo em campanhas. Um caso recente é o da eleição de Obama.
O folclore pós-eleitoral deu à internet um papel decisivo. Não houve isso. A curva das pesquisas até 60 dias antes da eleição mostrava McCain à frente, cristalizando uma pequena, mas sustentável, diferença. A agenda bushiana de McCain se impunha: melhor as guerras no Iraque e no Afeganistão que o terror em casa. Naquele momento, naufragou o Lehman Brothers, as Bolsas despencaram, as demissões começaram e a fragilidade do sistema financeiro expôs as suas vísceras.
A agenda foi invertida e passou a ser a crise e o emprego. As curvas das pesquisas se cruzaram e Obama desfilou até a vitória final. Em 1989, Collor impôs a sua agenda: ética pública e modernidade econômica (“marajás” e “carros-carroças”). A força da agenda lançou a imagem de seus adversários de maior peso parlamentar e tempo de TV ao passado e a votações desprezíveis. Em 1998, a campanha de FHC travestiu a crise econômica de insegurança aportada pela chapa Lula-Brizola e impôs a agenda. Bill Clinton, em 1992, impôs sua agenda (“é a economia, estúpido”).
Pelo jeito, a campanha do governo já tem a sua agenda: Lula. Todo o resto (PAC, Bolsa Família, saída da crise…) será miragem.
Lula é uma agenda forte e vencedora? Pode ser. Mas agenda se disputa na batalha eleitoral. Se essa agenda for o debate da campanha, ela/ele ganha. Cabe à oposição impor a sua. Mas, para isso, precisa ter agenda. Por enquanto, nem candidato tem. E a agenda precisa ser personalizada pelo ator que caiba nesse papel.