Publicado em 07/11/2009 em Folha de São Paulo
LUKACS, EM “Cinco Dias em Londres” (Zahar), analisando a designação de Churchill para primeiro-ministro, em maio de 1940, e a queda de Chamberlain (e sua política de apaziguamento com a Alemanha), avalia a dinâmica da percepção dos ingleses.
A impopularidade de Churchill vai até a ocupação de Praga, em março de 1939. Os fatos legitimaram sua radicalidade. Lukacs fala de um binômio -opinião pública/ sentimento popular-, válido até os dias de hoje. “Opinião pública” seria um processo de convergência entre as pessoas a partir da informação sistematizada, difundida pela imprensa e por líderes de opinião.
“Sentimento popular” seria a reação das pessoas aos fatos, produzindo uma sensação mais ou menos difusa. Essa reação pode ser uma onda que vai chegando à emoção das pessoas.
Como tomar decisões que requerem apoio de massa num quadro de transição desses? A decisão, em si, poderá ser mobilizadora? Churchill vai ao Parlamento e às rádios e propõe um jogo da verdade: “Sangue, suor e lágrimas”. Mas como acompanhar o processo e saber com que velocidade vai cristalizando consciência na população?
As pesquisas de opinião, da forma como as conhecemos, eram um instrumento embrionário (EUA, Universidade Colúmbia, início dos anos 30). Mas não eram suficientes, porque captariam, no início, uma reação ainda superficial.
Lukacs usa os arquivos da Universidade de Sussex (GB) sobre “mass observation” (MO). Em 1937, dois ingleses (Madge e Harrison) criam um sistema de observações diretas nas ruas. “Em 1938, estenderam suas atividades aos campos da política e da guerra”, diz Lukacs. Não são pesquisas de opinião, mas “relatos de primeira mão por observadores de senso comum”.
“Não há um ponto de vista que se possa rotular como opinião pública, ela varia muito e não está ainda formada; a única coisa que resta é a crença de que a Inglaterra no fim acabará triunfando”, anota um observador.
Não é simples separar, numa pesquisa de opinião, “opinião pública” de “sentimento popular”. A TV estimula o “sentimento popular”, que, depois, aparece em pesquisas como “opinião pública”. O que muitas vezes não é ainda -ou nunca. A TV, na lógica da audiência, é muito mais indutora de sentimentos ou sua aceleradora do que formadora de opinião. Os líderes de opinião, intelectuais e políticos, ainda são formadores de opinião, mas não como antes.
O processo, hoje, se dá horizontalmente, por fluxos de “opinamento”, onde os líderes de opinião estão no meio da massa, e não “por cima” dela. Mas não são menos importantes. Os fluxos em que intervêm podem ser filtros formadores de opinião, o que exige suor. Não falam mais desde um “altar”.