Folha de São Paulo: 4/6/2011
A política tem tendências de longo prazo que se expressam, em números aproximados, nos processos eleitorais.
Nas eleições de 1947, por exemplo, PTB e PCB -partidos ligados ao “trabalhismo”- somaram uns 12% dos deputados federais. Nas eleições seguintes, foram crescendo progressivamente, até que em 1962 o PTB tornou-se o principal partido, com uns 30% dos deputados federais.
O golpe de 1964 interrompeu esse processo, mas apenas provisoriamente. Com a redemocratização, o “trabalhismo” retornou com cara própria -com o PDT e o PT, inicialmente. E esse processo se repetiu: partindo praticamente de uns 10% dos deputados federais, seu crescimento foi permanente. A diferença é que agora o “trabalhismo” é muito mais pulverizado.
O PT tem 16,5% dos deputados, e a este somam-se PDT, PSB, PC do B, PSOL… para chegar aos mesmos 30% ou pouco mais.
Quem olha as correntes abaixo da linha do mar ou a floresta de cima perceberá essas tendências. Mas há eleições que são pontos fora da curva. Por exemplo, a do Plano Cruzado de 1986, quando o PMDB elegeu todos os governadores, menos o de Sergipe, e 52% dos deputados federais.
Quem pensou que tal eleição lançava uma nova tendência, se deu mal.
Dois anos e meio depois, Fernando Collor vencia as eleições presidenciais disputando com Lula o segundo turno. Brizola foi o terceiro candidato mais votado. Em 1990, o PMDB passava a ter 20% dos deputados federais.
A eleição de 2010 é outro ponto fora da curva. Um presidente mitificado, entrando no processo eleitoral como fator exógeno, gravando “telemarketing”, aparecendo na TV, inventando sua candidata a presidente e elegendo-a, pedindo votos aos seus e contra os adversários, num processo nunca visto nas democracias maduras. Ele levou o que queria: a máquina presidencial.
Mas, para não ter riscos, foi cedendo espaço nos Estados para seus parceiros. O PT fez 16,5% dos deputados federais, cinco governadores -só dois em Estados mais importantes: Bahia e Rio Grande do Sul.
Portanto o ponto fora da curva pela popularidade do presidente em 2010 deixou fundações tão frágeis quanto em 1986 -quando, depois, ocorreu o que ocorreu.
Em 2012 e em 2014, o processo eleitoral voltará à normalidade. Isso não quer dizer que uma ou outra força política se beneficiará. Apenas que não haverá fator exógeno. O custo dos artificialismos para ganhar parceiros já está sendo cobrado e as eleições serão competitivas.
Todos estão no jogo. Perdedores serão aqueles que se agarrarem naquele ponto fora da curva de 2010. Cairão como aqueles que caíram depois de 1986. O PMDB parece ter aprendido a lição.