COLÔMBIA DO AVESSO!
(O Estado de S. Paulo, 31) No dia 19 os colombianos escolherão o vencedor das eleições presidenciais. Desde já se conhece o grande perdedor: o establishment político. De polos opostos, o ex-guerrilheiro de esquerda Gustavo Petro (com 40% dos votos no 1.º turno) e o magnata populista de direita Rodolfo Hernández (28%) encarnam a fome por mudanças.
A Colômbia tem uma história peculiar na América Latina. Nos “anos de chumbo” ficou imune a uma ditadura militar. Por décadas o governo foi dividido entre conservadores e liberais. Durante a “onda rosa” dos anos 2000, o país optou pela linha conservadora e pró-mercado de Álvaro Uribe e seus correligionários.
A estabilidade política e o crescimento econômico contrastam com quase 50 anos de guerra civil contra milícias marxistas, além da guerra contra o narcotráfico. O incumbente uribista Iván Duque foi lento na implementação do acordo de paz e das reformas. A desigualdade, uma das maiores do mundo, despertou protestos antes da pandemia e foi agravada por ela. Fartos com a violência, a corrupção e a desigualdade, os colombianos querem mudanças. Mas a sabedoria popular adverte: cuidado com o que você deseja. Nem toda mudança é necessariamente para melhor.
Petro e Hernández têm mais em comum que o apelo às mudanças. Ambos foram prefeitos, respectivamente de Bogotá e Bucaramanga, com resultados medíocres. E ambos apresentam propostas inconsistentes e rasgos autoritários.
Se eleito, Petro será o primeiro presidente de esquerda. Ele foi duas vezes senador e concorre pela terceira vez à Presidência. Moderando o discurso, diz-se agora favorável a uma “economia de mercado social-democrata”. Mas muitas propostas permanecem radicais, como empregos públicos para todos os desempregados, gratuidade do ensino superior ou o banimento de novas explorações de óleo e gás. Ele promete financiar seus programas com mais impostos, exportações agrícolas e a receita do turismo. Mas, para que ela compense a dos hidrocarbonetos, teria de igualar o turismo argentino e brasileiro juntos.
Hernández parece ainda mais inconsistente – e autoritário. Ele só entrou para a política recentemente e pouco se sabe sobre suas propostas. Sua campanha foi simplista e agressiva, suscitando comparações com Donald Trump e Jair Bolsonaro. Ele se recusou a participar dos debates e atribui praticamente todos os problemas da Colômbia à corrupção.
O próximo presidente governará com um congresso fragmentado. A coalizão de Hernández obteve só duas cadeiras e ele promete não fazer alianças com políticos. A coalizão de Petro conseguiu o maior bloco, mas não a maioria, e ele enfrentará a desconfiança das elites econômicas e políticas.
Agora que eles terão de disputar os votos do centro, espera-se que os colombianos premiem o mais comprometido com renovações sem rupturas, ou seja, que se mostre mais apto a consolidar a paz e reformar as estruturas que perpetuam velhas insatisfações dos colombianos, como a corrupção e a desigualdade, sem debilitar os alicerces que garantiram a estabilidade política e econômica do país.