11 de fevereiro de 2022

O BRASIL NO ÚLTIMO PELOTÃO DOS LATINOS!

(O Estado de S. Paulo, 10) Superado com vigor o primeiro impacto da pandemia, a economia latino-americana perde impulso, volta ao ritmo anterior ao surto de covid-19 e se defronta com três desafios simultâneos: garantir contas públicas sustentáveis, elevar o potencial de crescimento econômico e promover importantes ganhos sociais, favorecendo a coesão e combatendo as desigualdades. Formulados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o diagnóstico e a receita são dificilmente contestáveis por qualquer político responsável, informado e disposto a trabalhar pelo desenvolvimento de seu país e da região. Nesse quadro, as perspectivas de expansão do Brasil são inferiores, sem surpresa, às de outras grandes economias da América Latina e do Caribe – uma desvantagem visível já no período petista e mantida, e até agravada, nos três anos de mandato já completados pela presente administração.

A forte reação econômica foi suficiente, no ano passado, para a maior parte da região voltar aos níveis de atividade anteriores à pandemia, normais para os latino-americanos e geralmente inferiores aos de outros emergentes, principalmente da Ásia. O Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina e do Caribe encolheu 6,9% em 2020, cresceu 6,8% em 2021 e deve expandir-se 2,4% neste ano e 2,6% no próximo, segundo informe do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, desde janeiro chefiado pelo brasileiro Ilan Goldfajn, ex-presidente do Banco Central do Brasil. Na América do Sul, o PIB deve aumentar 1,8% em 2022 e 2,2% em 2023. O ganho estimado para 2021, de 7,1%, compensou com folga a perda de 6,5% na onda inicial da pandemia. Nessas contas, a economia brasileira se distingue duplamente das demais.

A primeira diferença aparece no balanço de 2020. Nesse ano o PIB do Brasil diminuiu 3,9%, num recuo bem menor que o observado em outros países da América Latina e de grande parte do mundo capitalista – uma vantagem proclamada mais de uma vez pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. A segunda, bem visível quando se volta ao cenário mais comum, confirma o menor vigor da economia brasileira, já evidente em anos anteriores ao choque inicial da pandemia.

O crescimento projetado para o Brasil – de 0,3% em 2022 e de 1,6% em 2023 – é bem inferior ao estimado para outras economias da região. Exemplo: depois de uma perda de 5,9% em 2020, a produção chilena cresceu 12% em 2021 e deve aumentar 1,9% neste ano e também no próximo. As taxas estimadas para a Colômbia são de 4,5% em 2022 e de 3,7% em 2023. O salto do ano passado, de 10,2%, superou amplamente a queda de 2020, estimada em 6,8%.

Houve avanços inegáveis na maior parte da América Latina, no último quarto de século. As economias ficaram menos frágeis, houve menos crises graves e os países tornaram-se menos dependentes do socorro do FMI. Acordos de financiamento ainda foram assinados, mas em situações menos dramáticas e acompanhados de condições mais suaves.

No Brasil, o cenário favorável durou cerca de dez anos, neste século. Os padrões de governo começaram a ser afrouxados no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e entraram em colapso nos primeiros anos da presidente Dilma Rousseff. Muitos bilhões foram queimados em políticas erradas, como a dos “campeões nacionais”, enquanto se deteriorava a infraestrutura, a ineficiência era favorecida pelo protecionismo, a Petrobras era pilhada e a indústria de transformação perdia competitividade e relevância. A recuperação econômica nunca se completou, depois da recessão de 2015-2016, e as noções de planos e programas federais praticamente sumiram a partir de 2019.

O Brasil tem recuado duplamente – em relação à própria história de modernização econômica e em relação aos padrões mundiais e regionais. Embora menos industrializados, outros países latino-americanos têm mostrado dinamismo bem maior que o brasileiro, condições fiscais mais saudáveis e menor propensão a surtos inflacionários. As novas projeções do FMI confirmam a evidente desvantagem brasileira, mas quem, no Ministério da Economia, ainda leva a sério o FMI?