REMOÇÃO!
(Cesar Maia – Folha de SP, 17/04/2010) A expressão “remoção” foi cunhada no início do regime autoritário, entre 1964 e 1965, para nominar a transferência compulsória de moradores de algumas favelas de bairros de classe média no Rio para conjuntos habitacionais construídos em bairros afastados, com recursos dos programas de ajuda dos EUA.
A palavra “remoção” aplicada à mudança de objetos foi usada pelo regime autoritário, nas demolições de favelas, para marcar uma ação de força. Passou a carregar, dali para a frente, essa marca repressiva no imaginário da população.
No Império, o problema habitacional dos mais pobres não foi colocado como questão. Os pobres eram basicamente escravos e viviam no local em que trabalhavam.
O problema começa a surgir com o retorno das tropas da Guerra do Paraguai e se agrava com a exclusão dos escravos, pelos fazendeiros, após a Abolição. Surgem e proliferam os cortiços.
A reforma sanitária do Rio iniciou a demolição dos cortiços e a abertura de fronteiras para a expansão imobiliária. O caso de maior força simbólica foi a queima do cortiço Cabeça de Porco (passou a ser a denominação dos cortiços), em 1892, na base do morro da Providência, em frente à ferrovia Central do Brasil. A solução foi subir o morro, que depois se ampliou com o retorno das tropas de Canudos.
Chamaram favela, planta onde ficava o acampamento. A reforma urbana do Rio, em 1904, com suas demolições, construiu apenas um pombal de 200 microcasas.
Em 1928, a prefeitura contratou o arquiteto francês Alfred Agache (que criou o termo urbanismo) para o plano urbano do Rio, publicado em 1932. Agache tratava as favelas como equipamentos provisórios e lastimava que Santa Teresa se tornara permanente.
Para o ato, foram convidados arquitetos famosos. Um deles, Ed Groer, russo, quis ver onde os pobres moravam e cunhou a frase “favela é solução” ao comentar as condições de areação e insolação comparadas às dos cortiços.
As expansões imobiliária e industrial e a opção por não investir em transporte de massa e em habitação popular atraíram a mão de obra para perto do local de trabalho. O adensamento começou a produzir conflitos. Em 1942, realizou-se a primeira demolição com forte simbolismo, transformando em fogueira a favela do largo da Memória, no Leblon. No final dos anos 40, o STJ confirmou o usucapião das cinco maiores favelas.
O vereador Carlos Lacerda defendia a urbanização. Um programa de acesso à cidade e a seus serviços e de moradia digna se transformou em confronto. A expressão “remoção” afirmou um estilo repressivo e unilateral, transformando o que deveria ser um direito dos pobres em direito dos ricos. Agora volta com a mesma entonação