TEMPESTADE MAIS QUE PERFEITA!
(Josef Barat, economista, Consultor de Entidades Públicas e Privadas, Coordenador do Núcleo de Estudos Urbanos da Associação Comercial de São Paulo – Estado de SP, 19) O discurso inaugural de Churchill no Parlamento como primeiro-ministro, em maio de 1940, foi claro, duro e realista, preparando os ingleses para os tempos sombrios que viriam. A Europa estava sendo ocupada rapidamente pelas tropas nazistas e Londres, sendo alvo de ataques aéreos. Sua frase mais contundente foi: “Eu diria à Casa, como disse àqueles que se juntaram a este governo: nada tenho a oferecer senão sangue, trabalho, lágrimas e suor”. Não recebeu aplausos, mas com coragem e visão preparava os britânicos para o que estava por vir: cinco longos anos de guerra e sofrimento.
Como um grande estadista e estudioso da História, particularmente da história das guerras, sabia muito antes da maioria o que se passava na Alemanha: reconheceu o poder do inimigo e a importância de enfrentá-lo. Mais do que a defesa do seu país, tratava-se da luta pela liberdade e pelos valores mais caros à civilização. Com o poder da palavra, conseguiu mobilizar e unir o povo pela defesa da sua liberdade e valores. Outros líderes também demonstraram essa capacidade em outros contextos difíceis e de variadas formas. Roosevelt e De Gaulle. Também Gandhi e Luther King, por exemplo, conseguiram unir pela palavra. Esses grandes estadistas e líderes, portanto, em momentos críticos, tiveram a capacidade de unir, de criar convergências, de dar esperança e transmitir empatia e humanidade com seu povo.
A democracia exige que grandes líderes saibam, dentro das regras do Estado de Direito, mobilizar e unir, mostrando a realidade dos fatos. Em regimes totalitários ou autoritários, não é a realidade que conta. A veracidade dos fatos é transmutada de acordo com a vontade do ditador e seu entourage. Por isso, corta-se o acesso ou manipula-se a informação, fantasia-se a realidade e nunca se revela a dimensão das tragédias. Assim, preocupa o que está acontecendo no Brasil durante a ascensão da pandemia do coronavírus. Como se não bastassem a angústia, o medo e a insegurança, e ante a falta de capacidade de atendimento diante da progressão geométrica do contágio, o governo optou insistentemente pelo descumprimento das orientações da OMS e das advertências de médicos, biólogos e pesquisadores. Ridicularizou evidências científicas, fez pouco caso do sofrimento das famílias e deu demonstrações explícitas e infantis de rebeldia contra as evidências do avanço da pandemia.
Como toda loucura metódica, vão se juntando assim os elementos para a formação de uma tempestade mais que perfeita. Diga-se, de passagem, que alguns elementos já estavam presentes neste governo antes de a pandemia chegar ao País: a recessão econômica prolongada, o desemprego elevado, uma inflação um tanto fora de controle e o desequilíbrio das contas públicas. Obviamente que a pandemia os agrava. Mas insistir na dicotomia economia versus pandemia é insistir no desvio da atenção e falta de ações concretas nos dois problemas. Mudar ministros, falsificar dados, não enfrentar a realidade e fazer pronunciamentos com duplas mensagens não vão contribuir em nada para deter o coronavírus e ativar a economia. Como não se fez o que tinha de ser feito, os danos já estão precificados. E para quem se preocupa tanto com a economia, uma surpresa: vai levar mais tempo para a recuperação, com o caos já instalado.
Nesta guerra que está sendo perdida para o coronavírus, os pronunciamentos impulsivos do presidente – ao contrário de grandes líderes e estadistas – não têm a capacidade de unir, dar esperança ou transmitir empatia, humanidade e compaixão. Com mais de 100 mil mortos e 3 milhões de contaminados, suas falas geram confusão, divergência, descumprimento de regras de civilidade e o relaxamento prematuro. Este desprezo pelo sofrimento é uma ofensa aos profissionais de saúde, trabalhadores em serviços essenciais e ao povo em geral. Em meio ao caos e diante de informações manipuladas, mensagens duplas quanto ao distanciamento social e reabertura do comércio, os economistas não têm muito o que fazer no momento.