19 de julho de 2019

SEMINÁRIO NA FGV COM MANUEL CASTELLS!

Relatório de Bruno Kazuhiro, presidente nacional da Juventude do DEM, 16/07.

– Felipe Santa Cruz, presidente OAB nacional

Hoje o Diário Oficial é o Twitter. E isso cai em um espaço sem lei. Quando uma reputação é aniquilada, por exemplo, não temos métodos jurídicos em tempo real para restituir isso. Pedimos que a pessoa tenha paciência. Temos que fazer o direito avançar.

Hoje a igualdade é nivelada por baixo. Há patamares mínimos de proteção. E todos que estão no direito se motivaram por aumentar essa proteção.

– Fernanda da Escossia, editora da revista Piauí e professora

Boatos sempre existiram, mas a sociedade atual, em rede, como diz Castells, permite uma disseminação muito mais veloz, repetida, contínua de notícias falsas.

Houve associação de elementos religiosos e de comportamento na busca da construção de um discurso de desinformação. O caso da terra ser supostamente plana por exemplo.

Existe uma avalanche de informações descontextualizadas.

Liberdade de expressão não é direito de mentir.

– Marco Aurélio Ruediger

Comenta a enorme existência de robôs nas redes sociais, de apoio a todos os principais candidatos, disseminando notícias reais em apoio e também muitas notícias falsas.

Grande influência das redes sociais na eleição para presidente do Senado, onde houve pressão significativa contra Renan Calheiros e contra a votação ser secreta.

Vazamentos sobre a operação Lava-Jato impulsionaram um crescimento vertiginoso de postagens nas redes sociais sobre o assunto e sobre as respostas dadas pelos envolvidos.

Na aprovação da reforma da previdência centenas de parlamentares faziam selfies e videos ao vivo, construindo suas narrativas sobre a votação e sobre sua participação nela.

Gigantesco impacto das falas e ações de Rodrigo Maia e Tabata Amaral no âmbito da reforma da previdência.

O centro político nas redes sociais se reconstrói em torno de Rodrigo Maia após estar ausente da discussão eleitoral. Rodrigo recebe críticas à esquerda e à direita, mas passa a ser a cara do centro. O centro continua indo pior nas redes, mas teve agora um protagonista.

Se o centro assumir a construção de narrativas e uma cara, isso pode ajudar a quebrar a perversa polarização que temos.

O debate político agora se intensifica também em momentos que não são eleitorais. É constante.

Continua existindo uma enorme quantidade de robôs atuando nesse debate e na desinformação.

Dinâmica social com uso de redes e comunicação em tempo real é o “novo normal”. Transformou política e economia de forma permanente em nossa sociedade.

Nos EUA existem redes sociais de direita, onde se debatem ideias e discursos que depois vão para outras redes majoritárias. É um ecossistema.

Muitas redes não possuem sede no Brasil. Como responsabilizar conteúdos nocivos e responsabilizar sem atacar a liberdade de expressão?

As escolas de comunicação e jornalismo ainda estão no século XX. No Brasil principalmente. A própria FGV precisa contribuir com essa modernização.

– Manuel Castells

O poder existe de duas formas: coerção e convencimento, que podem se somar. O poder que se apóia apenas na coerção é débil.

Ambas as formas têm algo em comum: a batalha se dá na mente de cada pessoa. Os humanos são animais sociais. Então estamos falando de comunicação.

A comunicação portanto altera as relações de poder em todas as sociedades.

As redes sociais desmontam as estratégias de construção do poder existentes até antes delas. Saímos dos meios de comunicação de massa e vamos à comunicação de rede em massa. Concordo que é o “novo normal”.

A informação, pelas grandes agências e pelas empresas, está cada vez mais centralizada. Mas a comunicação está cada vez mais descentralizada. Quanto mais comunicamos, ao mesmo tempo mais somos vigados e nossas informações concentradas. Os poderes reais nunca tiveram tanta informação sobre os cidadãos e os cidadãos nunca tiveram tanta capacidade de comunicar e vigiar aqueles que os vigiam.

Qualquer pessoa com um smartphone denuncia qualquer coisa. Os poderosos se escondem. Afinal, todo poderoso faz algo que não quer ver divulgado. Estão todos na “clandestinidade”.

Os grandes meios de comunicação perderam poder. Não decidem eleições. As redes sociais decidem a partir de narrativas feitas em cima de notícias dos meios de comunicação.

Somos animais emocionais. Não somos racionais. Fundamentalmente fazemos escolhas por emoções. Racionalizamos emoções. Depois de escolher o que queremos acreditar, filtramos as mensagens que queremos receber e bloqueamos as que não queremos. Na vida pessoal, social e política. Assistimos programas e lemos jornais que sabemos que vamos estar de acordo. Não queremos nos cansar debatendo internamente o tempo todo.

Nos informamos para confirmar o que acreditamos e não para saber das coisas. A participação nas redes sociais então é feita a partir de uma tomada de decisão mental prévia, oriunda da construção de quem somos.

Esse cenário destrói hoje a arquitetura social do progressismo no mundo inteiro. A esquerda, muito mais que a direita, acredita que se o seu programa atende às necessidades racionais do cidadão, ganhará o voto. Mas não é assim. São as emoções que decidem. Há gente que acredita que vacinas são ruins.

Então os programas de regressão social, demagógicos, crescem. Mas temos que entender porque as pessoas estão aplaudindo essas ideias. Apenas desqualificar os autoritários fica dentro do elitismo, não se conecta com as massas. Estamos em uma época de combate à razão.  Se estamos numa época de incerteza e crise de legitimidade, então cada pessoa irá se agarrar ao que ela acredita, ao que ela tem certeza. Isso explica a eleição de Trump, Brexit, ascensão da extrema direita na Europa. O Brasil também, que infelizmente não é um caso original. É um processo muito maior onde a verdade é que as emoções negativas quanto a temas de direitos humanos são majoritárias na população.

A concentração de renda atual ajuda a crise de legitimidade. Os impostos ajudando os grandes bancos na crise econômica mais recente também explica a crise de legitimidade. A falta de renovação interna dos partidos políticos, a vontade dos mais velhos de se perpetuar e cooptar o sangue novo, também explica a crise de legitimidade.

Os jovens adoram as redes sociais e a tecnologia por ser uma cultura de autonomia. Os jovens adoram autonomia. Os setores que se sentem vulneráveis frente à tecnologia que eles não entendem, que elimina postos de trabalho, que ajuda concentração de renda, são as faixas mais velhas da sociedade.

Há então a ruptura da confiança, gerando emoções negativas e rejeição a elementos que os intelectuais cosmopolitas entendem ser tão óbvios e racionais.

Os demagógicos então vão para as emoções e usam as redes sociais para disseminar seu discurso e ganhar batalhas culturais, construindo uma mentalidade a favor de políticos que vencem pela democracia mas defendem valores contra a democracia. Não temos dúvida de que são demagogos, mas quem permite a subida desses demagogos?

Sabemos que empresários cosmopolitas financiaram movimentos brasileiros, como o MBL, e construíram narrativa aproveitada pelos demagogos. Eles não sabiam que estavam construindo isso.

Estamos em um mundo novo, de construção de redes e grupos. Essas redes e grupos são manipulados por robôs financiados por poderosos. Eles não inventam mensagens, eles ativam emoções que existem e que já sabem que funcionam. Basta tocar nas emoções conservadoras. Todos querem segurança em um mundo incerto. Como superar o medo? Será que preciso de uma arma?

Cabe ao progressismo encontrar formas de contrapor e mostrar seus valores humanos. Uma compreensão profunda das relações entre sociedade, poder e comunicação.

Costumo irritar meus amigos ao não responder “o que fazer”. Meus valores estão claros e minhas observações também. Mas acredito que as fórmulas são sempre profundamente específicas, não me atreveria a dizer o que Brasil precisa fazer. Mas posso dizer que o país entra hoje na ditadura da era da informação, que manipula a população contra os direitos humanos e desconstrói as instituições, as universidades, etc. A resistência final à desinformação é uma população bem informada.

Posso dar um conselho: Não neguem a realidade. Se há milhões de pessoas que sentem emoções que nos parecem primitivas, aceitemos que é assim e passemos a buscar respostas e soluções para essas pessoas. Os analistas brasileiros serão capazes de construir instrumentos para ajudar essa consciência.