18 de junho de 2021

É APENAS RECUPERAÇÃO CÍCLICA!

(Claudio Adilson Gonçalez – O Estado de S. Paulo, 14) Qualquer economia está sujeita a flutuações cíclicas, ou seja, a alternância de períodos de expansão (boom) e de contração (recessão). No primeiro caso, pode-se formar um excesso de demanda, que resulta em pressões inflacionárias, exigindo políticas contracionistas. No segundo caso, ocorre o contrário. A taxa de desemprego supera seu nível de equilíbrio não inflacionário, e isso demanda estímulos expansionistas, tanto monetários como, se houver espaço, fiscais.

Não há consenso entre os economistas quanto ao processo de geração dos movimentos cíclicos na economia. A escola monetarista considera como principal causa as intervenções da política monetária, que expandem ou contraem a atividade econômica, às vezes excessivamente. Já os keynesianos atribuem essas flutuações, principalmente, a oscilações na demanda por investimento.

Excessos de euforia, intensificados por sistemas financeiros mal regulados, e choques exógenos, como foram as crises do petróleo, nos anos 70, ou a atual pandemia, podem também gerar períodos recessivos.

Mas não se deve confundir as fases de recuperações cíclicas com expansão econômica sustentável. O PIB evolui em movimentos ondulatórios em torno de uma tendência de longo prazo. É a inclinação positiva dessa linha de tendência que mensura o crescimento econômico.

Nessa métrica, o desempenho da economia brasileira, nos primeiros 20 anos desse milênio, tem sido decepcionante. No período 2001 a 2020, o PIB per capita evoluiu à taxa anual média de 0,95%. Não fosse a acentuada contração do ano passado, provocada pela pandemia, essa taxa poderia ter sido pouco superior a 1%.

Nesse ritmo, serão necessários 60 anos para o Brasil dobrar sua renda per capita. A China, provavelmente, fará isso em pouco mais de uma década. E mesmo esse pífio crescimento se processa com enorme injustiça social. É claro que isso decorre de causas estruturais, que inibem o crescimento do investimento e da produtividade.

No início deste mês, governo e mercado financeiro comemoraram efusivamente os dados divulgados pelo IBGE relativos ao PIB do primeiro trimestre. Isso me fez lembrar o famoso pibão prometido por Dilma Rousseff, no final de 2012, quando o Brasil estava se aproximando de uma longa e severa recessão, da qual ainda não se recuperou totalmente.

A recuperação em “V” observada no Brasil, em relação ao desastre econômico de 2020, se deu em quase todos os países do mundo. Ela decorreu das características da contração do ano passado, que não se deveu a causas comuns geradoras dos movimentos cíclicos, mas sim a um vírus devastador.

Nos países desenvolvidos, a volta à normalidade, propiciada pelo sucesso da vacinação, sugere uma fase de expansão vigorosa e relativamente longa. No Brasil, a queda no isolamento social, à custa da elevação assustadora das mortes, aliada a estímulos fiscais e monetários temporários, além de expressiva recomposição de estoques na indústria estão por trás da variação do PIB acima da esperada, que vem se observando desde o terceiro trimestre de 2020, exacerbada no início de 2021. Tais fatores podem gerar alguma sobrevida para a recuperação, mas o Banco Central terá que tirar o chope da festa, elevando o juro básico para além do que se esperava, para não perder o controle da inflação.

O mais grave é que o governo Bolsonaro não avançou, e dificilmente avançará, em reformas estruturais que elevem a tendência de crescimento de longo prazo da economia. Assim que for eliminada a atual capacidade ociosa, hoje mais clara no mercado de trabalho, o crescimento ficará limitado à pífia expansão verificada nos últimos 20 anos.

Portanto, guardem os fogos. Não há o que comemorar. Está havendo apenas recuperação cíclica. Estamos longe da retomada do crescimento sustentável.