CRISE DE ENERGIA MUNDIAL!
(Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura – O Estado de S. Paulo, 04) As mudanças climáticas são uma realidade ao redor do mundo. As consequências dos desastres climáticos têm levado à escassez de eletricidade e a tarifas cada vez mais elevadas. Estamos presenciando uma época de extremos. Invernos cada vez mais frios e verões com temperaturas recordes, além de furacões que isolam regiões e derrubam linhas de transmissão. Isso tem trazido impactos e dificuldades na chamada transição energética.
A forte seca na Califórnia fez o governador declarar estado de emergência e suspender as regras de qualidade do ar. O Estado, que vem apostando agressivamente em energia eólica e solar, agora está adicionando várias usinas movidas a gás natural. A Comissão de Energia da Califórnia aprovou licenças para geradores de gás de emergência por até cinco anos e chegou à conclusão de que não pode ficar refém de energias intermitentes que têm causado inúmeros blecautes ao longo dos últimos meses de 2021.
O Chile também vem enfrentando problemas similares. A seca no país fez com que o Ministério de Energia chileno publicasse em agosto um decreto estabelecendo um conjunto de medidas preventivas para evitar o racionamento de energia elétrica. Segundo o decreto, as medidas vigorarão até 31 de março de 2022 e têm como objetivo evitar, gerir, reduzir ou ultrapassar os déficits de geração que podem ocorrer no Sistema Elétrico Nacional, preservando a segurança.
No Brasil a situação não é muito diferente. De acordo com dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico, estamos vivendo a pior escassez de água dos últimos 91 anos. E nos últimos 20 anos a nossa matriz elétrica também ficou refém das chamadas energias intermitentes, pois, embora ainda permaneça a predominância da fonte hídrica clássica, o crescimento da oferta foi marcado pela forte expansão da eólica e das hídricas a fio d’água.
De acordo com relatório do centro de estudos Ember, de Londres, divulgado em março de 2021, as emissões do setor de energia voltaram a aumentar no primeiro semestre do ano e estão, agora, 5% maiores que as do mesmo período de 2019, antes da pandemia. Um dos motivos deste aumento está relacionado à volta do uso do carvão para atender à demanda por eletricidade. No momento em que os países são pressionados por mais energias limpas, a queima de carvão na geração de energia vem ganhando força. Por quê? Porque a retomada do crescimento econômico está exigindo um aumento do consumo de energia com confiabilidade e segurança.
De um lado, temos as tragédias climáticas; do outro, a corrida contra o tempo para a transição energética; e no meio dos dois, a falta de energia e, consequentemente, tarifas cada vez mais caras. O açodamento em fazer a transição para fontes limpas está demonizando os combustíveis fósseis e aumentando o risco da segurança energética. Mas como assegurar uma transição energética num mundo cada vez mais pobre, mais populoso, plural e que, para ter qualidade e dignidade de vida, necessita de eletricidade?
É preciso cautela e seriedade. A transição energética exige tempo para ser solucionada, portanto um planejamento efetivo deve ser posto em prática com tranquilidade, serenidade e sem açodamento. No curto prazo, um esforço conjunto entre governantes e governados deve ser empregado para que seja possível um melhor gerenciamento entre mudanças climáticas e transição energética. No médio prazo, o planejamento precisa priorizar a segurança energética por meio de térmicas a gás e nuclear, preferencialmente próximas aos centros de carga.
Esses tipos de geração podem ser a solução na configuração atual em que há a busca pela redução de emissões, em prol do clima global, ao tempo em que garante a resiliência do sistema elétrico para a retomada das economias pós-pandemia. No longo prazo, o setor elétrico precisa de um balanço entre as fontes distantes, sazonais e intermitentes com fontes de geração constante e próximas aos centros consumidores, garantindo, assim, a segurança no sistema e o cuidado com o meio ambiente.
Não podemos permitir que, depois da crise financeira de 2008 e depois da pandemia de 2020, se tenha de enfrentar uma crise de energia em escala global cujos desdobramentos podem levar a uma nova crise sanitária e ao caos social.