08 de maio de 2020

CORTE MAIS FUNDO NOS JUROS. E A INFLAÇÃO MERGULHA!

(Celso Ming – O Estado de S. Paulo, 07) O BC já antecipou que terá de continuar a cortar juros. Mas ninguém se iluda: não serão os juros no andar térreo que vão reativar a economia.

Nesta quarta-feira, o Banco Central cortou os juros básicos (Selic) mais do que o esperado: cortou 0,75 ponto porcentual. Estão agora em inéditos 3,0% ao ano, mas, em seu comunicado, admite mais um corte adicional de até 0,75 ponto porcentual na próxima reunião do Copom, agendada para 16 de junho.
Movimento igualmente importante do Banco Central é o reconhecimento de que a inflação esperada para todo o ano passa a ser de 2,0%, bem abaixo dos 3,0% indicados na reunião anterior do Copom e dos 4,0% em que está fixada a meta de inflação deste ano.

Mas vamos primeiramente aos juros. Como das outras vezes, sempre haverá quem entenda que, nas circunstâncias, o Banco Central devesse ser até mais agressivo e cortar a Selic mais fundo, de maneira a irrigar a economia com mais dinheiro. Pode ser, mas, também nas circunstâncias, seria improvável que maior redução da Selic ajudasse a reativar a atividade econômica, o emprego e a renda, porque a política monetária perdeu tração.

Não é por falta de crédito que a economia está rodando em marcha a ré. Está andando para trás porque o consumo despencou e a população está (mais ou menos) entocada para se defender do vírus. E, se tudo seguir de acordo com o presumível, o consumo deve cair ainda mais, porque o desemprego é alto e em crescimento, e o poder aquisitivo encolheu.

Os bancos continuam relutantes nas suas operações de empréstimo, porque o risco aumentou substancialmente. Grande número de endividados, tanto pessoas físicas como empresas, não terá como honrar seus compromissos e o melhor que poderá fazer é tentar renegociar os termos do seu passivo. Como mostrou a divulgação dos balanços nas últimas duas semanas, no final do primeiro trimestre deste ano, somente três bancos privados (Itaú Unibanco, Bradesco e Santander) amontoaram provisões (reservas) de R$ 21,7 bilhões para enfrentar calotes e atrasos no pagamento de dívidas de seus clientes.

Ou seja, não é falta de crédito nem escassez de moeda na economia que estão derrubando a atividade econômica e o consumo. Ainda assim, o momento pede dinheiro mais farto e mais fácil ou, como avisou o Banco Central no seu comunicado, “a conjuntura econômica prescreve estímulo monetário extremamente elevado”.

A inflação também está vindo abaixo. Nesta sexta-feira, o IBGE divulgará o IPCA, a medida do custo de vida, de abril. A expectativa é a de que virá um número fortemente negativo. O último Boletim Focus, divulgado semanalmente pelo Banco Central, mostrou que 119 líderes do mercado financeiro projetam para 2020 uma inflação média de 1,97%. Nas próximas semanas, essa estimativa deverá voltar a ser rebaixada. A probabilidade de que a evolução do IPCA afunde mais para o terreno negativo parece aumentar. Esse deslizamento embute certas distorções, já expostas nesta Coluna há algumas semanas. (Apenas resumindo, o IBGE, organismo encarregado do levantamento constante dos preços vigentes no mercado, opera agora com grandes limitações. A cesta de consumo sofreu alterações relevantes, especialmente nos segmentos de combustíveis, serviços pessoais, alimentação fora de casa e transporte público. Além disso, com o comércio fechado, ficou mais difícil aferir os preços praticados.)

Independentemente disso, o consumo caiu. Basta conferir como se reduziram as despesas feitas pelo cartão de crédito do consumidor de classe média. E este parece ser fator suficiente para continuar a derrubar os preços, como simples resultado da lei da oferta e da procura. Como a probabilidade de deflação ou de uma queda constante de preços é cada vez maior, o Banco Central não poderá dar os trâmites por findos em sua política monetária. Terá de continuar a cortar os juros, como já antecipou. A pergunta que segue é: até onde e até quando? Quem tem resposta firme para ela ou está mal informado ou está se enganando. Mas ninguém se iluda: não serão os juros no andar térreo que vão reativar a economia.

Também será preciso saber se o Banco Central está pronto para emitir moeda, seja pela recompra de títulos no mercado secundário, prevista no Projeto de Emenda da Constituição 10/20, seja simplesmente ajudando o Tesouro a enfrentar suas despesas.