08 de agosto de 2016

ASSIM FOI CRIADA A OLIMPÍADA DE 2016 NO RIO!

Respostas por e-mail, a Ítalo Nogueira da Folha de S. Paulo – em 03/08/2016.

P- Como começou a campanha da Rio-2004? Quem a criou?
R- Após ser eleito em 1992, em março de 1993 fui procurado pelos srs. João Havelange e Roberto Marinho e os recebi no Palácio da Cidade. Afirmaram que superação da crise de longo prazo do Rio era ser sede de uma Olimpíada. Que eu deveria inscrever o Rio como cidade-candidata. Não seria escolhida a primeira vez, mas a terceira ou a quarta vez. Assim foi feito. Brasília era a cidade candidata à Olimpíada. O COB reuniu seu Conselho e o Rio assumiu o lugar de Brasília. E começou o processo das candidaturas do Rio.

P- O sr pode dar mais detalhes da reunião de Havelange e Marinho com o sr em 1993? Esse debate havia na campanha para prefeito? O pedido deles foi inspirado no sucesso de Barcelona?
R- Em todas as experiências anteriores inclusive Pré-Guerra.

P- Por que decidiu-se deixar de fora o COB nessa campanha? Nuzman se queixa bastante disso.
R- O COI havia decidido que as candidaturas olímpicas deveriam ser coordenadas pelos comitês olímpicos nacionais. Não sabíamos. Tivemos apoio do Globo para substituir Brasília. Erramos ao tentar fazer uma coordenação política e depois o apoio voltou. Demonstrado porque na disputa Rio x S. Paulo (MARTA era prefeita de SP eu do RIO) a simpatia total foi pelo Rio. A cobertura das apresentações das cidades no auditório do BNDES e a cobertura de nossa vitória foi total. A proximidade do COB (Nuzman) e da Rede Globo é muito grande.

P- Por que a proposta do Fundão não vingou? Urbanistas dizem que faria mais sentido do que a expansão para a Barra.
R- Essa foi a proposta de Barcelona. Só eu fui contra. Meu argumento era operacional. Na Barra da Tijuca a caneta do prefeito decidia tudo. No Fundão seriam 5 canetas: Conselho Universitário, Governo Federal, Governo Estadual, COB e Prefeitura. O golpe final veio em 1996, quando a Comissão do COI esteve aqui analisando o projeto do Rio. Fui contatado reservadamente por um espanhol que compunha a Comissão do COI que me disse que o Fundão era inviável. Nas suas palavras: A Olimpíada é uma festa da raça. As teleobjetivas não podem fazer um foco ao mesmo tempo num superatleta e em alguém subnutrido.

P- Como foi a decisão de disputar o Pan-07?
R- Quando retornei à prefeitura após a eleição de 2000 fui procurado pelo Nuzman pedindo que eu subscrevesse a carta que o Conde havia preparado para a ODEPA. Trouxe a proposta da Região do Maracanã ser a base do complexo Olímpico. Eu disse que não concordava. Teria que ser a Barra da Tijuca por duas razões: 1) segurança pública, pois era uma área de 3 entradas/saídas e edificações separadas pelo plano Lúcio Costa. 2) porque permitia construir um complexo Olímpico amplo e integrado. Nuzman aceitou.

P. Quando o sr fala que o Fundão era uma “proposta de Barcelona”, refere-se a que? Os organizadores de Barcelona-92 ajudaram a elaborar a proposta da Rio-04?
R- Desde 1993 até 2000 a equipe de Barcelona foi consultora da prefeitura do Rio no Plano Estratégico. Conde era muito próximo deles. Consultoria profissional com os mesmos arquitetos-urbanistas responsáveis pelos JJOO-Barcelona.

P- Quem decidiu transformar o Pan-07 em padrão olímpico? Originalmente, ele já não era uma vitrine para a futura candidatura do Rio para a Olimpíada?
R- Vencemos em 2002, na Cidade do México, de San Antonio que era uma cidade dos EUA pronta com todos os equipamentos. Três argumentos nossos foram vencedores: a) Nuzman falou em descentralizar pelos Comitês Olímpicos nacionais a cobertura unitária e integrada da TV, o que permitia a eles ganhos de patrocínio. b) Segurança Pública pelas características da Barra da Tijuca e pela ausência de riscos de terrorismo. c) a importância da paralimpíada que teria apoio semelhante. Vencemos. O projeto era simples e barato. O COB foi chamado pelo COI com a presença de um ex-presidente Samaranche que disse que projeto não ganhava mais candidatura. Era necessário dar garantia aos patrocinadores potenciais. E que, para isso, os equipamentos previstos para o PAN deveriam mudar completamente e ser equipamentos olímpicos. E assim foi. As críticas sobre os novos custos do PAN não levaram isso em conta.

P- O que significa a proposta do Nuzman, para o Pan-07, de “descentralizar pelos COs a cobertura unitária e integrada da TV”? Não houve uma OBS no Pan, como há na Olimpíada? Os direitos de imagem foram pulverizados?
R- O COB garantiria os direitos de imagem (aliás pagos pela prefeitura) e os COs latino-americanos definiriam as coberturas que lhes interessavam. Seriam feitas estas ampliações e garantidos os links aos COs que poderiam negociar os patrocínios em seus países.

P- Qual foi a importância da candidatura de 2012?
R- Na lógica de Marinho e Havelange as candidaturas sucessivas se reforçam e se ajustam. Todas são importantes por isso.

P- O Rio recebeu uma nota pior do que o Doha na primeira avaliação para 2016. Como se classificou e como superou as desconfianças?
R- Numa reunião no Palácio Guanabara, Havelange disse que a cúpula do COI estava muito preocupada com o poder “influenciador” dos países árabes-petroleiros. E que a imagem que ficaria era de cumplicidade. O argumento da Comissão no dia da escolha das finalistas em Atenas em junho de 2008, depois de lido o nome de Doha é que as áreas de Doha exigiriam descentralizar a Olimpíada, o que não seria possível. O Rio foi incluído no lugar de Doha e já partiu com equipamentos testados no PAN, com a presença dos presidentes das federações internacionais e do COI e com o projeto integrado na Barra pronto na área do autódromo, com 3 equipamentos já construídas e articulados pela Linha Amarela com o Estádio Olímpico para o atletismo, modalidade fundamental.

P- Paes disse que no plano estratégico de seu primeiro governo já havia a previsão de buscar a Olimpíada, como forma de alavancar uma cidade que perdeu sua vocação. Foi isso mesmo? Isso já foi inspirado em Barcelona? Por que a Olimpíada era vista como um catalisador para isso?
R- Foi como contei, uma iniciativa conjunta de Roberto Marinho e João Havelange. Esse foi o start, ponto de decisão.

P- Quais mudanças a proposta de 2012 sofreu para 2016? Metro, arenas, finanças…
R- Lembro que o projeto da candidatura para 2016 foi entregue pela prefeitura do Rio e o COB, ao COI em dezembro de 2008 com as cópias traduzidas. Curiosamente a única atividade que o RIO teve nota 10 em 2007 pelo COI foi mobilidade/transportes. O fundamental foi o gerenciamento do tráfego. As linhas fechadas eram flexíveis nos horários, ao contrário de hoje, cuja rigidez produziu os engarrafamentos. 2016 medido pelo número de atletas na Vila Olímpica é o dobro de 2007. Bem. Basicamente seguimos as recomendações do COI em relação a dar segurança total em relação a qualidade dos equipamentos –olímpicos- desde o PAN-2007 e a Vila Olímpica. Aliás, a Vila do PAN, definida pela prefeitura seria onde está localizada a Vila Olímpica. Mas uma imobiliária conseguiu mudar a localização para onde foi feito apesar dos riscos por ser um terreno turfado. O TCU identificou um sobre-faturamento de aluguéis pagos pelo Ministério dos Esportes e mandou reduzir. O ministro Vilaça esteve comigo e explicou. Mas os aluguéis estavam cobertos pelo aumento de gabarito para 12 andares. Aliás, agora é a mesma coisa. O que pagaria os aluguéis seria o aumento de gabarito (modelo Barcelona) de 12 para 18 andares. Mas o CO–2016 está pagando ao mesmo tempo pelo menos 250 milhões (valor de 2014) pelo aluguel dos apartamentos dos atletas.

P- O sr. acha que valeu a pena essa busca? O Rio conseguiu encontrar sua vocação?
R- A busca de sede da Olimpíada pelas cidades têm 4 vetores: a imagem global da cidade, a inserção na elite esportiva preparando atletas, o legado urbano e os eventos esportivos em si. O Rio, pela coincidência da crise de 2014-2016, perdeu o efeito imagem, perdeu o ponto de preparação de atletas para subir os degraus de elite esportiva e fez a escolha de legados urbanos que só poderão amadurecer em prazos mais dilatados, como o Porto Maravilha que micou com a crise do mercado imobiliário. Mas não há dúvida que o quarto vetor, a qualidade dos eventos esportivos, será conquistada.

P- Os filhos de Roberto Marinho também participaram da origem da candidatura de 2012 e 2016?
R- Basicamente a partir do PAN, quando um representante da TV apresentou o projeto da Globo, que se mostrou muito positivo, pois integrava “heróis anônimos” que criavam pequenos polos de um esporte e integrava as escolas e professores de educação física. Com isso, a cobertura desde uns anos antes era nacional e inclusiva. 15 dias depois do PAN fui convidado pelo Dr. João Roberto Marinho para participar da reunião, acho que mensal, das mídias do sistema Globo. Havia uma discussão entre eles se um grande evento como aquele e esse atual valeria a pena para a cidade e para a empresa. Defendi e justifiquei. A opinião favorável dos diretores foi vitoriosa, especialmente porque a cobertura pela TV aberta e especialmente paga (SporTV) foi um sucesso, segundo o diretor de jornalismo Schreder, hoje diretor geral da Rede Globo. Mas pelo que senti havia 60% a favor e 40% contra. Na saída reclamei de um artigo no Globo de Ali Kamel, segundo do jornalismo na época, criticando duramente o PAN e grandes eventos. Dr. João Roberto disse que aquilo mostrava a liberdade interna da Globo.

P- Urbanistas criticam o fato das PPPs olímpicas preverem a exploração imobiliária na zona oeste, o que seria uma pressão para a ocupação dessa área considerada ambientalmente frágil. O sr acha que a escolha da Barra provoca essa pressão? Ela foi boa para a cidade? Não seria melhor insistir no Fundão?
R- O ponto não é esse. Até porque será o mercado que ditará os prazos de ocupação. O ponto é que não se conheceu nem se conhece os valores incorporados nas concessões de espaço e gabaritos. Por exemplo: Na área do autódromo –onde está todo o Parque Olímpico –25% é ocupada pelos equipamentos esportivos e 75% pelos prédios que serão construídos.